Látex e Borracha: Como o Projeto TecBor e a Engenharia transformam o Mercado

O projeto TecBor (sigla de Tecnologia Alternativa para Produção de Borracha na Amazônia), desenvolvido desde 1997 pelo Laboratório de Tecnologia Química do Instituto de Química (Lateq/IQ) da Universidade de Brasília (UnB), tem sido de extrema importância para a produção e pesquisa de borracha no país, trazendo novas tecnologias que impactam não só o meio acadêmico, mas também a sociedade.

O TecBor se tornou um laboratório de tecnologia de látex e borracha, desenvolvido como pesquisa de bancada e em experimentos de campo, ambos coordenados pelo professor Floriano Pastore Jr., um dos fundadores do projeto. Dentre as pesquisas realizadas, podemos citar o desenvolvimento da tecnologia FDL (Folha de Defumação Líquida) e o projeto Látex-Tan (látex hipoalergênico).

FDL – Folha de Defumação Líquida

A FDL foi uma das primeiras pesquisas do projeto TecBor, sendo uma tecnologia desenvolvida há mais de 20 anos que agregou um grande valor não só na produção de borracha, mas principalmente na vida das comunidades dos seringais. A FDL é feita diretamente pelos seringueiros, usando procedimentos simples e seguros – diferentemente do método tradicional de defumação, bastante prejudicial à saúde – além de não precisar passar por usinas de beneficiamento, como outras borrachas primárias, podendo ser encaminhada diretamente para a utilização industrial.

O tratamento da borracha com fumaça é uma técnica histórica utilizada pelas comunidades indígenas da Amazônia e América Central. Por meio da defumação no processo de coagulação do látex (processo de transformação para a borracha bruta), é possível agregar propriedades antioxidantes ao produto, que contribuem para a sua qualidade final. Entretanto, a inalação constante da fumaça é prejudicial para a saúde do trabalhador.

O TecBor, por meio de suas pesquisas, propôs o uso da condensação da fumaça para a produção de ácido pirolenhoso, uma solução líquida produzida na carbonização da madeira (costuma ser um subproduto da produção de carvão vegetal). Com isso, o processo de coagulação do látex teve a defumação tradicional substituída por “fumaça líquida”, melhorando as condições de permanência dos trabalhadores no seringal.

Látex-Tan

A mais nova pesquisa do laboratório foi a do projeto Látex-Tan, onde se desenvolveu um método para produção de látex hipoalergênico não tóxico, utilizando tanino da casca da árvore Acácia-negra, uma substância, comumente utilizada para curtimento de couro, para alimentação animal e para tratamento de águas e efluentes, dentre outras inúmeras aplicações.

O uso do tanino parte do princípio de entrar como substituto da amônia, substância adicionada ao látex que atua como conservante. Diferentemente do tanino, além de ser uma matéria tóxica e acumulativa, a amônia não é capaz de bloquear as proteínas que envolvem as partículas de látex que, ao entrar em contato com o corpo da pessoa alérgica, causam as reações.

Além das questões alergênicas, a aplicação do tanino vegetal em todo o processo de látex contribui da mesma forma para a sustentabilidade e resistência, tendo em vista que não só é uma alternativa mais segura e ambientalmente amigável, mas que também vem se mostrando mais resistente que os produtos feitos com látex “comum”.

Dentro da unidade do galpão do TecBor, foi inaugurada uma micro fábrica da Látex-Tan, no final do ano de 2023, contendo uma pequena linha de produção de luvas de látex hipoalergênicas sem amônia. Isso é um início de uma produção que pode partir para o ramo industrial, mas que no momento depende somente da avaliação completa de não alergenicidade das luvas produzidas dentro da fábrica, uma vez que possuem apenas a garantia de serem hipoalergênicas. Esse processo vem sendo comprovado através de voluntários que contribuem para a validação deste estudo.

Luva de látex hipoalergênico não tóxico. Foto: https://latextan.com.br/.

Processo de Produção

Na produção das luvas de látex, a atuação do engenheiro químico é fundamental em várias etapas, principalmente pela aplicação de operações unitárias que garantem a eficiência e a qualidade do produto final. O processo começa com a extração do látex natural da seringueira, seguido por sua purificação e estabilização pelo processo de pré-vulcanização. Nesta fase, a centrifugação é essencial para separar o látex de impurezas e água, permitindo uma concentração adequada de borracha. A operação de cremagem também pode ser empregada para aumentar ainda mais a concentração do látex por meio da adição de agentes que induzem uma aglomeração mais compacta entre as partículas.

No processo de imersão (dipping), moldes de cerâmica são mergulhados no látex preparado. O controle da viscosidade do látex e da taxa de imersão é crucial para determinar a espessura e uniformidade das luvas. Após a imersão, o processo de gelificação assegura que o látex coagule adequadamente sobre o molde, utilizando agentes coagulantes para formar uma película sólida e elástica, chamada de bainha. O engenheiro químico também pode atuar no controle térmico das etapas de secagem e vulcanização, garantindo a resistência e flexibilidade do produto final. Por fim, aplica-se o talco e o processo termina testando a qualidade e integridade das luvas, inflando-as com ar comprimido.

Se você se interessou pelo projeto, sabia que pode contribuir para o desenvolvimento de luvas de látex mais seguras e eficazes? O Projeto Látex-Tan está selecionando voluntários para participar de testes com suas luvas. As luvas são embaladas e armazenadas antes de serem encaminhadas para os voluntários, que ajudarão a garantir a qualidade do produto. Se você deseja participar, preencha o formulário disponível aqui. Todas as informações adicionais são compartilhadas em um grupo de WhatsApp. Para mais informações do Projeto, acesse https://latextan.com.br/.

Autoria: Guilherme Malta, Janaína Cecilio e Rhauender Mota, integrantes da Equipe EnsinEQ do AIChE Brasília.

instagram.com/aichebrasilia/

Referências

Látex-Tan. Tecnologia para látex natural sem amônia e não alergênico. Látex-Tan. Disponível em: https://latextan.com.br/. Acesso em: 14 dez 2024.

LUIZ, Gabriel. UnB desenvolve e registra camisinha com látex à prova de alergia; veja explicação. G1 Distrito Federal. 18 jun 2018. Disponível em:https://g1.globo.com/df/distrito-federal/noticia/unb-desenvolve-e-registra-camisinha-com-latex-a-prova-de-alergia-veja-explicacao.ghtml. Acesso em: 14 dez 2024.

NASCIMENTO, Kaline Rossi; PASTORE JR., Floriano; PERES JR., João Bosco Rodrigues. Produção de Borracha FDL e FSA: Guia de Treinamento. WWF – Brasil. 2015. Disponível em: https://d3nehc6yl9qzo4.cloudfront.net/downloads/guia_borracha_fdl_fsa.pdf. Acesso em: 14 dez 2024.

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TANAC. Látex sem amônia e hipoalergênico: projeto da UNB em parceria com a Tanac desenvolve produtos a partir do látex natural a partir de tanino de Acácia-negra. TANAC. 19 fev 2024. Disponível em: https://www.tanac.com.br/latex-sem-amonia-e-hipoalergenico-projeto-da-unb-em-parceria-com-a-tanac-desenvolve-produtos-a-partir-do-latex-natural-a-partir-de-tanino-de-acacia-negra/.  Acesso em: 14 dez 2024.

PASTORE JR., Floriano; COSTA, Krysten; VERAS, Priscila; ALVES, Amanda; VERAS, Thaís; PIMENTEL, Luíz. Teoria e prática da produção de luvas de látex. Minicurso da XVII Semana de Química da UnB – Novembro de 2024. Apresentação do Powerpoint.

VELOSO, Serena. Pesquisadores da UnB criam luva cirúrgica hipoalergênica. Universidade de Brasília. 2023. Disponível em: https://noticias.unb.br/117-pesquisa/7041-pesquisadores-da-unb-criam-luva-cirurgica-hipoalergenica. Acesso em: 15 dez. 2024.

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