A escassez de água livre de contaminação tem sido uma grande questão mundial. Embora a maior parte da superfície terrestre seja composta por água, a disponibilidade desta para o consumo direto de plantas e animais é bem restrita e finita. Diferentemente dos mares e oceanos, que representam aproximadamente 97% da água do planeta, os rios, lagos e os lençóis freáticos, juntamente com a água da chuva, disponibilizam a chamada água doce, essencial para o consumo e para a manutenção de ecossistemas (AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS, 2019).
O crescimento populacional e os meios de produção demandam uma alta exploração dos recursos hídricos, utilizados na geração de energia, na agricultura e em inúmeras indústrias. O agravante da poluição torna o problema ainda mais acentuado, ao passo que as águas subterrâneas e superficiais recebem uma ampla gama de poluentes, como metais pesados, compostos inorgânicos e orgânicos complexos (CHONG et al., 2010; LI et al., 2010).
Dois exemplos trágicos ilustram essa realidade no Brasil. Em 2015, o rompimento da barragem de rejeitos da SAMARCO em Mariana (MG) despejou uma enorme quantidade de material tóxico nos rios da região, “ceifando vidas humanas, contaminando rios e destruindo florestas inteiras” (LOPES, 2016, p. 1). Em 2019, o desastre se repetiu com o rompimento da barragem da VALE em Brumadinho (MG), cujos rejeitos atingiram o rio Paraopeba, causando a morte de animais e tornando a água imprópria para o consumo (SANTOS, 2019). Tais eventos expõem a vulnerabilidade dos nossos recursos hídricos e a necessidade urgente de tecnologias de remediação eficazes.
Para mitigar tais riscos, o Estado brasileiro adota medidas como a Lei nº 12.334/2010, que estabelece a Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), visando proteger a vida, a saúde pública e o meio ambiente (BRASIL, 2010). A importância da água também é refletida globalmente em dois dos dezessete Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU: “Água Potável e Saneamento” e “Vida na Água”, reforçando o compromisso mundial com a Agenda 2030 (ONU, 2015).
Diante desse cenário, pesquisadores de todo o mundo buscam alternativas ecologicamente aceitáveis para a limpeza ambiental. A biorremediação, que utiliza organismos vivos (bactérias, fungos e plantas) para degradar ou neutralizar poluentes, surge como uma estratégia promissora e sustentável. Essa técnica é capaz de absorver seletivamente compostos complexos e pode ser uma solução econômica para a remediação de solos e águas contaminadas (TAN et al., 2022).
Contudo, a eficiência da biorremediação enfrenta desafios significativos. A presença de substâncias de alta toxicidade e metais pesados, comuns em rejeitos de mineração e em lixiviados de aterros sanitários, pode inibir a atividade microbiana, dificultando o tratamento biológico (STAMPS et al., 2016). Além disso, a complexidade e a variabilidade dos contaminantes exigem, muitas vezes, tecnologias complementares para garantir uma descontaminação efetiva em larga escala (CHOUDHURY, 2023).
É para superar essas limitações que a nanotecnologia se apresenta como uma ferramenta revolucionária. Idealizada conceitualmente por Richard P. Feynman (1959) e nomeada por Norio Taniguchi (1974), a nanotecnologia permite manipular a matéria em escala nanométrica (1 a 100 nm). O avanço da microscopia, como a invenção do microscópio de corrente de tunelamento em 1981, permitiu a visualização e manipulação em nível atômico, impulsionando a área (LOPEZ-GASSO, 2018).
A grande vantagem dos nanomateriais reside em sua imensa relação superfície/volume. Essa característica confere a eles propriedades mecânicas, ópticas, magnéticas e, principalmente, uma reatividade química muito superior à dos mesmos materiais em escala macroscópica. Tal reatividade torna-os catalisadores extremamente eficientes, capazes de degradar poluentes resistentes ou de atuar como veículos para a entrega de nutrientes a microrganismos, potencializando a remediação ambiental com maior eficiência e menor custo (RAJ KUMAR; GOPINATH, 2016; DASTJERDI; MONTAZER, 2010).
A combinação sinérgica dessas duas áreas — conhecida como nanobiorremediação — surge, portanto, como uma abordagem de vanguarda. As nanopartículas podem, por exemplo, neutralizar compostos tóxicos que impediriam a ação de bactérias ou acelerar a quebra de poluentes complexos em substâncias mais simples, que podem então ser facilmente degradadas pelos microrganismos.
Diante do exposto, este trabalho tem por objetivo realizar uma revisão crítica da literatura sobre o uso da nanotecnologia como um agente catalisador para otimizar os processos de biorremediação de águas e solos contaminados. Serão discutidos os principais métodos nanotecnológicos, as vantagens e desvantagens de sua aplicação combinada e os desafios para sua implementação no Brasil, visando fornecer uma base científica sólida para o desenvolvimento de soluções mais eficientes e sustentáveis para mitigar os impactos das atividades poluidoras no país.
Referencial teórico: fundamentos da ação nanométrica
2.1 A Química da Nanoescala: Explicação dos princípios de área de superfície específica e o aumento da reatividade em comparação com materiais macroscópicos.
Na atualidade, a Nanoescala é um campo na qual a tecnologia tem se expandido muito durante os últimos anos, especialmente nos estudos de superfície específica. A área de superfície específica é um parâmetro dominante em modelos de permeabilidade e no transporte de espécies que podem adsorver nas superfícies minerais (CESSA et al., 2009). A área de superfície específica é geralmente expressa em metros quadrados de superfície por grama de sólido m²/g (INTERNATIONAL UNION OF PURE AND APPLIED CHEMISTRY, 2014).
A área de superfície pode ser calculada através do método Brunauer-Emmett-Teller (BET). É comumente aplicado para calcular a área superficial específica com base em medições da isoterma de adsorção de nitrogênio (CESSA et al., 2009). O modelo BET pressupõe a adsorção multicamadas de gás na superfície do adsorvente (ANTON PAAR, s.d). Portanto, é necessário cautela na seleção de dados para a análise da área superficial do MMS, na qual a condensação capilar, em vez da adsorção multicamadas, pode ocorrer na região de pressão acima, especialmente para poros pequenos (WOLFROM, 2022).
Ela fornece diversas informações importantes sobre sua estrutura física, pois a área da superfície de um material afeta a forma como esse sólido interage ao seu redor. Muitas propriedades, como taxas de dissolução, atividade catalítica, retenção de umidade e prazo de validade, são frequentemente correlacionadas à área superficial de um material.
A área superficial de um material pode ser alterada tanto durante a síntese quanto no processamento. Superfícies adicionais são criadas quando uma partícula é subdividida, resultando no aumento de sua área superficial (WOLFROM, 2022). De forma similar, a criação de poros no interior da partícula, seja por dissolução, decomposição ou outro meio, também resulta em um aumento significativo da área superficial. O que possibilita qualquer material sólido, portanto, pode ter sua área superficial determinada através do método de adsorção de gás.
Isso pois, devido a sua fórmula, área do objeto/partícula dividido pela massa do própria, a superfície específica em escalas microscópicas, devido sua massa extremamente pequena, tendem a possuir uma superfície específica maior que outros tipos de dimensões, como a macroscópica. A escala macroscópica ainda podendo ser uma escala pequena em certos casos, ela possui uma massa ainda muito maior que a microscópica, tornando sua massa específica menor e menos capaz de fazer absorção de outros tipos de materiais (WOLFROM, 2022).
2.2 Mecanismos de Interação Nanopartícula-Poluente: Detalhamento dos processos de adsorção e catálise potencializados.
No caso, o uso dos processos de adsorção, fenômeno físico-químico em que moléculas, íons ou átomos se acumulam na superfície de outra substância, se relaciona de maneira bem objetiva com a superfície específica. Isso porque a superfície específica, como já é descrito, é a área total de um material por unidade de massa ou volume, e como já mencionado, o tamanho da partícula em escalas microscópicas causa um aumento de sua área específica. Essa maior área, por sua vez, proporciona melhores condições de interação, o que é crucial para entender reações, catálise e a própria adsorção (FERREIRA e RANGEL, 2009).
Especificamente, existem diversos fatores que podem afetar o processo físico-químico da adsorção, como área superficial, as propriedades do adsorvente e do adsorvato, a temperatura do sistema, natureza do solvente e o pH do meio. A natureza físico-química do adsorvente é fator determinante, pois a capacidade e a taxa de adsorção dependem da área superficial específica, porosidade, volume específico de poros, distribuição do tamanho de poros, dos grupos funcionais presentes na superfície do adsorvente e da natureza do material precursor (DOMINGUES, 2005).
Somado a isso, o tamanho da partícula é um fator que influencia no processo de adsorção, uma vez que sempre a velocidade adsortiva é dependente do transporte intrapartícula. Além disso, a polaridade do solvente ou do adsorvente, também causa um grande impacto sobre a relação intramoleculares, o que diretamente afetam a adsorção (DOMINGUES, 2005). Nesses processos, a temperatura do sistema afeta principalmente a constante de velocidade de adsorção. Um aumento na temperatura pode ocasionar no aumento da energia cinética e na mobilidade das espécies do adsorvato e ainda provocar aumento na taxa de difusão intrapartícula do adsorvato (JIMENEZ e BOSCO e CARVALHO, 2004).
A adsorção assim como é afetada por diferentes tipos de aspectos físico- químicos é, na verdade, a primeira etapa para o processo de catálise heterogênea, processo químico onde o catalisador realiza adsorção na superfície do reagentes em estados físicos diferentes . A catálise heterogênea também pode ocorrer em diversos materiais como superfícies planas, sólidos porosos, superfícies planas e filmes lisos (SCHMAL, 2016).
Sistemas nanoestruturados também são de grande interesse do ponto de vista das aplicações tecnológicas da catálise (SCHMAL, 2016). Dentro do tema, devem ser destacadas as propriedades associadas a diferentes morfologias, atividades e seletividades, que são fortemente afetadas pela forma e tamanho das partículas, como no caso de fases metálicas cristalinas, na qual as faces do cristal são orientadas. Esses materiais têm sido extensivamente estudados atualmente, porque o pequeno tamanho e a alta relação superfície/volume (S/V) resultaram em propriedades mecânicas, ópticas, eletrônicas e magnéticas naturais em aplicações importantes.
2.3 Mobilidade e Dispersão: Análise da capacidade das nanopartículas de alcançar e tratar contaminantes em matrizes complexas de solo e água subterrânea.
Solos e águas subterrâneas quando contaminados podem ser considerados como locais que apresentam processos, de origem natural ou antrópica, caracterizados pela presença de substâncias químicas em concentrações capazes de causar problemas sérios à saúde humana e ao meio ambiente. A discussão sobre a contaminação do ambiente exige uma observação cuidadosa sobre os elementos potencialmente prejudiciais e que causam efeitos sobre os recursos naturais e a saúde da população, sendo os processos industriais, a mineração, a agricultura intensiva e o descarte incorreto de resíduos fazem grande parte das principais atividades que geram essas contaminações prejudiciais (MANFRON, 2020).
Nesse contexto, a tecnologia em nanoescala tem sido muito representada tendo em vista o impacto positivo que o uso de materiais nanoestruturados pode trazer para diversas áreas, incluindo a preservação do meio ambiente. A aplicação de nanotecnologia gera benefícios, uma vez que pode atuar na prevenção de poluição ou dos danos indiretos, contribuindo no tratamento ou remediação, tendo em vista que os nanomateriais apresentam propriedades de adsorção de metais e substâncias orgânicas que podem ser utilizados também para detecção e monitoramento de poluentes em locais com águas subterrâneas e contaminação no solo (MANFRON, 2020).
As tecnologias que utilizam nanopartículas podem ser divididas em dois grupos com base em suas reações químicas envolvidas. O primeiro diz respeito às tecnologias redutivas que usam as nanopartículas como doadoras de elétrons para transformar ou converter o contaminante em uma forma menos tóxica e menos móvel. A segunda é a estabilização e sorção, usando nanopartículas como um agente de sorbente ou imobilizante do contaminante.
Há evidências comprovadas sobre a efetividade e eficácia da aplicação da nanotecnologia em processos de remediação de solos e águas subterrâneas contaminadas por metais pesados, contaminantes inorgânicos, orgânicos e emergentes, sendo observado o uso de nanopartículas à base de ferro em sua maioria (MANFRON, 2020).
Aplicações e estudos de caso: o potencial técnico da nano remediação:
3.1 Remoção de contaminantes inorgânicos:
O nanoferro de valência zero (nZVI) é o nanomaterial que possui maior caso de estudos dentro da área para a remediação ambiental devido ao seu custo-benefício, abundância e baixa toxicidade. Sua funcionalidade se baseia na reação de redução e precipitação, transformando contaminantes em formas menos tóxicas ou insolúveis.
Em relação aos metais pesados o nZVI é altamente eficaz na redução do cromo hexavalente Cr(VI) para Cr(III) que precipita na superfície das nanopartículas. Já em relação ao arsênio (As) o nZVI é utilizado a fim de imobilizar o composto no solo e águas, a reação de oxidação do ferro gera óxidos e hidróxidos de ferro que atuam como ótimos adsorventes promovendo precipitação do arsênio fazendo com que este se estabilize no meio.
3.2 Degradação de poluentes orgânicos:
A fotocatálise heterogênea utiliza nanocatalisadores semicondutores como o dióxido de titânio (TiO2) e o óxido de zinco (ZnO) com o objetivo de realizar a reação de mineralização de poluentes orgânicos complexos na presença de luz. O nanocatalisador atua gerando um par de elétron-lacuna que reage com a água ou hidroxilas adsorvidas formando radicais hidroxilas altamente reativas que oxidam e quebram a estrutura dos poluentes orgânicos até completar sua mineralização.
Esta técnica é eficiente na degradação total de corantes industriais como vermelho remazol e de pesticidas que são caracterizadas como recalcitrantes onde tratamentos convencionais não são eficazes. Além disso, a técnica também é utilizada para degradar compostos orgânicos voláteis em efluentes gasosos como hidrocarbonetos complexos.
3.3 Materiais adsorventes avançados:
A área de materiais adsorventes avançados utiliza nanoestruturas com altíssima área superficial para a remoção de moléculas orgânicas complexas. Os Nanotubos de Carbono (NTC), em particular, são reconhecidos por sua capacidade de adsorver eficientemente poluentes como o Diclofenaco de Sódio. Uma grande vantagem técnica neste campo é a integração de nanopartículas funcionais magnéticas com os adsorventes. Essa funcionalidade permite a recuperação rápida e eficiente do material adsorvente contaminado do meio líquido (água ou efluente) pela aplicação de um campo magnético externo, superando a dificuldade de separação de nanopartículas do sistema após a remediação e viabilizando a regeneração do material.
A convergência tecnológica: sistemas híbridos e inteligentes
4.1 Aplicações híbridas e inteligentes da nanotecnologia
A nanotecnologia figura entre as áreas mais revolucionárias da ciência moderna, com destaque para o desenvolvimento das Smart Nanoparticles (Nanopartículas Inteligentes). Estes sistemas híbridos, que variam entre 1 e 100 nanômetros, são projetados para interagir de maneira controlada e altamente seletiva com o meio biológico, oferecendo soluções promissoras em diagnósticos e terapias.
O cerne da funcionalidade dessas nanopartículas reside na funcionalização de sua superfície, um processo de modificação química estratégica que confere à partícula a capacidade de transcender um estado inerte e executar funções predeterminadas. Essa engenharia de superfície é vital para alcançar a seletividade e o direcionamento a alvos específicos.
A arquitetura superficial é cuidadosamente determinada pela aplicação final. Dentre as principais estratégias, destaca-se a PEGilação (revestimento com polietilenoglicol), crucial para criar uma “nuvem” hidrofílica que estabiliza o sistema e o torna furtivo, prevenindo a opsonização e prolongando significativamente seu tempo de circulação no organismo. Para o direcionamento ativo, a superfície é conjugada com ligantes de alta afinidade (como anticorpos ou peptídeos). Esses ligantes são especificamente desenhados para reconhecer e se ligar a receptores superexpressos em células-alvo, como células tumorais, garantindo a entrega precisa do agente terapêutico ou de diagnóstico. Adicionalmente, o controle da carga superficial é manipulado para otimizar interações eletrostáticas com biomoléculas e membranas, enquanto grupos químicos reativos ou camadas de materiais (como metais e óxidos) podem ser incorporados para adicionar propriedades funcionais (magnéticas, ópticas).
A seletividade das Smart Nanoparticles é alcançada por dois mecanismos que frequentemente operam em conjunto:
- Direcionamento Passivo: Este mecanismo explora as características fisiopatológicas inerentes a certas condições, notavelmente o Efeito de Permeabilidade e Retenção Aprimorada (EPR). Em tecidos tumorais, a vasculatura é tipicamente permeável e a drenagem linfática é falha. Nanopartículas com o tamanho adequado conseguem extravasar e se acumular preferencialmente no tecido doente.
- Direcionamento Ativo: Reforça o sistema através da ligação específica dos ligantes de superfície aos marcadores das células-alvo. Essa especificidade eleva drasticamente a concentração local da nanopartícula, aumentando a eficácia terapêutica e minimizando os efeitos colaterais em tecidos saudáveis.
4.2 Imobilização de Agentes Biológicos (Nano-Biorremediação)
A Nano-Biorremediação é uma área de convergência que une a nanotecnologia e a biotecnologia ambiental para otimizar a degradação de poluentes. Este campo foca na imobilização de agentes biológicos (enzimas ou microrganismos/células) em estruturas nanoestruturadas, que agem como eficientes sistemas de entrega e proteção (Delivery System).
A imobilização restringe o movimento de enzimas ou células a um suporte sólido, como nanopartículas, preservando sua atividade biológica (SCIELLO, 2017). O uso de nanomateriais resolve as principais limitações dos biocatalisadores livres (solúveis):
- Estabilidade Aumentada: Enzimas livres são caras e facilmente desativadas por temperatura, pH ou inibidores. A imobilização em nanomateriais (nanopartículas magnéticas, óxidos de grafeno) protege a estrutura nativa, conferindo maior estabilidade térmica e operacional (UNESP, 2016; UFC, 2017).
- Reusabilidade e Economia: O alto custo e o volume de efluentes exigem a reutilização. As nanopartículas facilitam a separação e a reintrodução do biocatalisador no reator. Em sistemas magnéticos (nanopartículas de óxido de ferro), a recuperação é rápida via campo magnético externo, simplificando o processo e reduzindo o custo global (UNESP, 2016).
- Intensificação do Processo: O confinamento na matriz nanoestruturada permite manter uma elevada concentração de agentes ativos no biorreator, intensificando a taxa de reação e otimizando o microambiente.
Nanopartículas e outros nanomateriais são cruciais como matrizes de proteção e entrega. Enzimas (lipases, naringinase) são frequentemente imobilizadas por adsorção, ligação covalente ou encapsulamento (SCIELLO, 2017).
- Nanoestruturas Magnéticas (MNPs): Nanopartículas de óxido de ferro são suportes ideais devido à sua grande área de superfície e facilidade de separação. Permitem a fácil remoção do catalisador após a degradação e mantêm a atividade enzimática em múltiplos ciclos (UFC, 2017).
- Nanomateriais de Carbono: Materiais como o óxido de grafeno (GO) são eficazes devido à sua grande área superficial e abundância de grupos funcionais, que promovem a ligação e a estabilização de enzimas (UCS, 2016).
A imobilização de microrganismos vivos é essencial para processos de biorremediação em grande volume.
- Matrizes Poliméricas: O encapsulamento celular, geralmente com gel de alginato de cálcio, cria microgrânulos para proteger as células. Quando reforçadas com nanopartículas, essas matrizes ganham maior robustez e eficácia.
- Aplicações em Biorremediação: Microrganismos imobilizados são usados em biossorção (células não-vivas) e bioacumulação (células vivas) para o tratamento de efluentes, remoção de compostos recalcitrantes e metais pesados. O sistema de imobilização garante que as células sejam retidas no reator, mesmo em grandes volumes (CETEM, 2010).
Diagrama que ilustra uma nanopartícula magnética (MNP) servindo de suporte para enzimas, seguida da adição ao efluente, degradação do poluente e, por fim, a separação do biocatalisador por um campo magnético externo.

Fonte: Elaborado pelo autor (Adaptado de UNESP, 2016; UFC, 2017).
Em síntese, a imobilização de agentes biológicos em nanomateriais transforma a biorremediação, utilizando a Nano-Biorremediação para garantir que os biocatalisadores sejam mais estáveis, reusáveis e eficientes, acelerando a recuperação de áreas impactadas e reduzindo os custos operacionais.
4.3 Monitoramento em Tempo Real: Breve Menção aos Nano-Sensores para Acompanhamento da Eficácia e Segurança do Processo
A plena realização do potencial dos sistemas híbridos e inteligentes, discutidos nas seções 4.1 e 4.2, depende intrinsecamente da capacidade de monitoramento em tempo real. Nesse contexto, a nanotecnologia introduz os nanossensores e biossensores nano-habilitados, dispositivos que funcionam na escala nanométrica (10-9 m) e são capazes de transmitir informações físico-químicas ou biológicas do nanonível para o macroscópico (SCITECNOL, 2024).
Esses dispositivos representam uma revolução na capacidade de acompanhamento de processos, tanto em ambientes biológicos (saúde) quanto ambientais (biorremediação), oferecendo as seguintes vantagens críticas:
A principal contribuição dos nanosensores é a garantia da eficácia e da segurança de processos nanotecnológicos complexos.
- Monitoramento Biológico (Saúde): Na Nanomedicina, os nanosensores podem ser utilizados para monitorar a entrega e a atividade das Smart Nanoparticles (Tópico 4.1). Eles detectam biomarcadores específicos, como proteínas ou ácidos nucleicos, em estágios iniciais, ou ainda monitoram a liberação do fármaco, garantindo que o agente terapêutico esteja agindo no local e no momento desejado (GESTÃODS, 2023). Isso possibilita a tomada de decisão ágil e a personalização da medicina, reduzindo os efeitos colaterais ao fornecer visibilidade instantânea.
- Acompanhamento da Biorremediação: Em processos ambientais (Tópico 4.2), nanossensores são aplicados para o monitoramento contínuo de variáveis críticas, como a concentração de poluentes, o pH do solo ou da água, e a atividade metabólica dos microrganismos imobilizados. Dispositivos eletroquímicos e biossensores baseados em nanomateriais, como o grafeno, oferecem alta sensibilidade para detectar resíduos de pesticidas ou contaminantes, permitindo uma resposta imediata e precisa à variação da eficácia do processo de degradação (AGRIQ, 2024; INCT NANO AGRO, 2024).
Em resumo, os nanosensores elevam o patamar de controle e precisão, fornecendo a visibilidade necessária para atestar a segurança do uso de nanomateriais e para otimizar a performance dos sistemas nanotecnológicos em tempo real. Sua alta sensibilidade, aliada à miniaturização, permite o monitoramento de fenômenos em escalas e em áreas de difícil acesso para sensores convencionais.
Diagrama Conceitual da Aplicação de Nanossensores para Monitoramento em Tempo Real.

Fonte: Elaborado pelo autor (Baseado nos princípios da IoT e Nanossensores, GESTÃODS, 2023).
Desafios, impasses éticos e governança ambiental
5.1 Ecotoxicologia e Destino Final: Discussão sobre o risco de bioacumulação e a necessidade de desenvolvimento de nanopartículas biodegradáveis.
Diante de tudo já apresentado, é visto como para combater a contaminação ambiental o uso de nanotecnologia na biorremediação é muito eficaz. Entretanto, isso é um grande ponto positivo que pode acabar preocupando quanto ao seu destino final e seu impacto na natureza. Um dos perigos mais sérios relacionados à utilização dessas partículas é a bioacumulação. Pesquisas atuais demonstram que as nanopartículas de metais, como prata, cobre e óxido de zinco, têm a capacidade de se concentrar em seres aquáticos e no solo, e depois serem transmitidas pelas teias alimentares. Tal acontecimento tem o potencial de gerar consequências negativas para os animais, as plantas e, por consequência, para a saúde das pessoas, modificando atividades biológicas cruciais e causando instabilidade em todos os ecossistemas.
Sendo assim, é fundamental que se invista no desenvolvimento de nanopartículas biodegradáveis e que não causem danos ao meio ambiente. A ideia é que, depois de cumprirem sua função de reparação, elas consigam se desfazer naturalmente em substâncias que não ofereçam riscos. Essa nova leva de nanomateriais “ecológicos” procura diminuir o risco de envenenamento e aumentar a harmonia com o meio ambiente. No entanto, para que isso se torne realidade, é crucial investir em pesquisas que envolvam diversas áreas, juntando engenheiros ambientais, químicos, biólogos e toxicologistas, com o objetivo de entender a fundo o ciclo de vida desses materiais e como eles interagem no ambiente.
A ecotoxicologia, portanto, deve seguir junto com a nanotecnologia, oferecendo padrões de segurança e promovendo uma ciência mais atenta e responsável, que dê valor tanto ao progresso tecnológico quanto ao equilíbrio dos ecossistemas.
5.2 Lacunas Regulatórias: Análise da ausência de legislação específica para a aplicação e descarte de nanomateriais no meio ambiente.
O uso de nanotecnologia encontra outra barreira na falta de uma legislação clara que defina critérios de segurança, monitorização e destino final das nanopartículas utilizadas em processos de biorremediação. Essa ausência de regulamentação cria um cenário de incerteza tanto para os investigadores quanto para as empresas do setor ambiental.
No Brasil, grande parte das nanopartículas são fabricadas, empregadas e descartadas sem que se tenha uma avaliação minuciosa dos perigos que elas podem representar a longo prazo. A ausência de métodos uniformes para se medir o quão tóxicas elas são ou quanto tempo permanecem no ambiente também dificulta a criação de regras de fiscalização que realmente funcionem. Inclusive é muito importante que estudemos os efeitos que serão gerados no futuro com tal prática.
A implementação de mecanismos de governança ambiental deve priorizar a transparência, a rastreabilidade e a segurança no ciclo de vida das nanopartículas, desde a pesquisa até o descarte.
5.3 Viabilidade Econômica e Escalabilidade Industrial: Avaliação dos custos de produção em larga escala e o desafio de aplicação em grandes áreas.
Ao usar a nanotecnologia para limpar o ambiente ainda esbarra em problemas grandes, tanto de dinheiro quanto de como fazer. Criar nanopartículas bem puras, que não se desfaçam e que funcionem bem, precisa de máquinas caras, materiais bons e um cuidado enorme, o que faz o preço subir bastante. Pensando em usar isso em grande escala, como em fábricas sujas, rios poluídos ou terras estragadas pela agricultura, o dinheiro necessário fica ainda maior.
Outro problema é que é difícil fazer a mesma coisa que acontece no laboratório acontecer na natureza. Coisas como mudanças de temperatura, acidez, o que tem no solo e outros poluentes podem mudar como as nanopartículas agem e o quão bem elas funcionam, atrapalhando o resultado fora do laboratório.
Porém, a nanotecnologia verde aparece como uma boa opção para resolver alguns desses problemas. Ela usa coisas da natureza, como plantas, restos de colheitas e pequenos seres vivos, para criar nanopartículas de um jeito mais amigo do ambiente e mais barato. Além de diminuir os gastos, essa forma de fazer também ajuda a cuidar do planeta e incentiva a usar tudo de novo, criando um equilíbrio entre novidades e sustentabilidade.
Conclusão
A tese central deste estudo reside na busca por soluções eficazes e sustentáveis para a remediação de áreas contaminadas, um desafio ambiental de grande relevância. A análise da literatura evidenciou que, embora técnicas de biorremediação como a bioestimulação, a bioaumentação e a fitorremediação possuam méritos notáveis, sua aplicação encontra barreiras significativas, como a dependência de condições ambientais específicas, a lentidão dos processos e a eficácia limitada contra contaminantes persistentes, como metais pesados.
Nesse contexto, a nanotecnologia emerge como uma alternativa tecnológica de vanguarda, capaz de superar precisamente essas limitações. A utilização de nanopartículas oferece benefícios substanciais, como maior reatividade, especificidade e rapidez na degradação de uma vasta gama de poluentes orgânicos e inorgânicos. A sua capacidade de atuar em diferentes matrizes ambientais, solo, água e ar, confere-lhe um potencial transformador para o tratamento da poluição, representando um avanço significativo em relação às abordagens convencionais e biológicas.
A consolidação da nanotecnologia como uma ferramenta padrão para a despoluição ambiental depende, contudo, da superação de desafios cruciais. Embora seu potencial seja vasto, é imperativo que o avanço tecnológico seja acompanhado por uma rigorosa avaliação de seus impactos a longo prazo. Portanto, aponta-se para a necessidade de pesquisas futuras focadas na segurança da sua aplicação, investigando a ecotoxicidade das nanopartículas e seus ciclos de vida no meio ambiente para garantir que a solução não se torne um novo problema ambiental.
Para que essa tecnologia transite da escala laboratorial para a implementação em larga escala de forma eficaz e acessível, é fundamental o estabelecimento de modelos de parceria entre a indústria e a academia. A colaboração sinérgica entre centros de pesquisa, que desenvolvem o conhecimento fundamental, e o setor industrial, que possui a capacidade de investimento e produção, é o caminho para otimizar processos, reduzir custos e acelerar a transferência de tecnologia. Essa aliança estratégica é essencial para viabilizar a aplicação prática da nanotecnologia na recuperação de ecossistemas e, consequentemente, na promoção de uma melhor qualidade de vida para o planeta e suas futuras gerações.
Referências (Parte 1)
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BIBIANI, Cecília Quintão. O uso da nanotecnologia na despoluição do meio ambiente. 2022. Trabalho de Conclusão de Curso (Curso Técnico em Biotecnologia) – Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2022.
Referências (Parte 2)
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Texto elaborado pela equipe do AIChE Maringá.