A separação por membranas é uma tecnologia moderna e eficaz que atua como uma barreira seletiva entre duas fases, permitindo a passagem de apenas alguns componentes e retendo outros. Elas podem ser feitas de materiais inorgânicos (como cerâmicas ou metais) ou orgânicos (como polímeros ou líquidos), e se destacam por sua alta eficiência na remoção de contaminantes – desde partículas visíveis até compostos dissolvidos, como íons e micropoluentes.
Essa tecnologia é amplamente utilizada no tratamento de água e efluentes, promovendo a sustentabilidade e o reaproveitamento dos recursos hídricos. Diferente da filtração convencional, que opera em fluxo perpendicular, os sistemas de membranas utilizam fluxo tangencial, formando duas correntes: o concentrado (com os rejeitos) e o permeado (a água purificada).
A constituição das membranas pode ser molecularmente homogênea, ou seja, uniforme em composição e estrutura, ou quimicamente ou fisicamente heterogênea, por exemplo, contendo orifícios ou poros de dimensões finitas, ou apresentando algum tipo de estrutura em camadas. Entre os principais tipos de membranas estão:
- Microfiltração (MF): retém partículas de até 0,1 μm, podendo variar até 10 μm dependendo da pressão.
- Ultrafiltração (UF): semelhante à MF, mas com poros menores, retendo moléculas de menor peso molecular, como vírus e proteínas.
- Nanofiltração (NF): possui poros de cerca de 1 nm e rejeita principalmente sais divalentes e compostos orgânicos.
- Osmose Reversa (RO): com os menores poros, proporciona a mais eficiente retenção de contaminantes, incluindo sais, metais pesados e micropoluentes.
Membranas no Tratamento de Água
As aplicações incluem a remoção de micro e nanoplásticos, metais pesados, fármacos, pesticidas, corantes industriais, e até a dessalinização da água do mar. Tecnologias avançadas, como membranas nanocompósitas com grafeno ou dióxido de titânio, aumentam ainda mais o desempenho e a resistência desses sistemas.
Exemplos práticos, como o uso de ultrafiltração na Estação de Tratamento de Água (ETA) Lago Norte em Brasília, inaugurada em 2017 e referência nacional, demonstram a eficiência da tecnologia, especialmente em situações de crise hídrica, garantindo água potável com rapidez e confiabilidade — como ocorreu durante a crise hídrica de 2014-2018 no Distrito Federal.
Nessa estação, a ultrafiltração por membranas é aplicada logo após a captação da água bruta no Lago Paranoá e antes da desinfecção final com cloro, substituindo ou complementando a filtração convencional com areia. A água passa primeiramente por um pré-tratamento para remoção de sólidos grosseiros e, em seguida, pelas membranas, que retêm partículas, vírus, bactérias e protozoários, assegurando elevado padrão de qualidade antes da cloração e da distribuição. Esse processo se mostrou estratégico ao permitir uma resposta eficaz à escassez dos reservatórios tradicionais da região.
Vantagens e Desafios
Entre os benefícios do uso da tecnologia aplicada ao tratamento de água estão a alta eficiência na purificação, o menor uso de produtos químicos, a flexibilidade de aplicação e a contribuição direta à sustentabilidade ambiental. No entanto, há desafios, como o fouling (incrustação), que afeta todas as membranas e consiste no acúmulo de partículas, microrganismos ou compostos sobre a superfície, reduzindo a eficiência do processo. Esse fenômeno ocorre de forma distinta conforme o tipo de membrana: nas de microfiltração (MF) e ultrafiltração (UF), o fouling está mais associado à presença de partículas e matéria orgânica; já nas de nanofiltração (NF) e osmose reversa (RO), tende a ser mais severo, incluindo incrustações químicas, como a precipitação de sais, e o biofouling.
Além disso, o alto custo inicial, a necessidade de mão de obra qualificada e a vida útil limitada das membranas, que exigem manutenção e substituições periódicas, também figuram entre os principais desafios para a ampla adoção dessa tecnologia. Apesar dessas limitações, a separação por membranas representa uma solução promissora para os desafios atuais do saneamento e da gestão hídrica.
Autoria: Jeferson Matos, João Marcos Amaral e Rodrigo de Carvalho Sousa, integrantes da Equipe EnsinEQ do AIChE Brasília.
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